quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Pós-Graduação em Psicologia Junguiana - Coordenação Prof. Ms. Heráclito Pinheiro


A pós-graduação em Psicologia Junguiana teve seu projeto político-pedagógico elaborado a partir daquilo que Jung considerava como necessário e indispensável para qualquer um que desejasse compreender sua teoria e método terapêutico. Em carta datada de 1935, destinada ao Dr. Otto Körner, falou sobre o currículo básico para um psicoterapeuta:


Acho que seria proveitoso se o senhor comunicasse ao Prof. K a minha opinião sobre o currículo (da psicoterapia). Há tempos mandei ao professor Goring um memorando nesse sentido. Exijo sobretudos conhecimentos psiquiatria clinica e das neuropatias orgânicas. Em segundo lugar uma analise didática, 3. Certo grau de formação filosófica, 4. Estudo da psicologia dos primitivos, 5.ciência comparada das religiões, 6. Mitologia, 7. Estudo de psicologia analítica, começando pelo conhecimento da técnica de diagnóstico das associações, da técnica de interpretação de sonhos e fantasias, 8. Aperfeiçoamento da própria personalidade, a saber, desenvolvimento e diferenciação das funções que precisam de formação. Estas são as exigências que faço a um aluno. Naturalmente há poucas pessoas que podem satisfazer estas exigências, mas desde sempre me recusei a produzir artigos em série. Sobretudo não gostaria de dar a impressão de que acho que a psicoterapia é um brinquedo intelectual de crianças. (Jung, 2001, p.201).

Seguindo as exigências proposta por Jung, elaborei nossa grade, no que concerne a exigência número 3 “certo grau de formação filosófica”, há, em nosso currículo, 3 disciplinas de filosofia, enfocando os principais filósofos que influíram no pensamento de Jung, ou com os quais teve de dialogar, com especial destaque para Kant a quem ele se referia como “o meu filósofo”, bem como os filósofos do movimento romântico e Platão, Aristóteles e Heráclito. Nosso professor das disciplinas de Filosofia é Getúlio Zagreu, graduado e mestre em Filosofia pela UFC (o currículo de todos os professores está no final desse texto). No que concerne à psicologia dos primitivos, temos uma disciplina de introdução a Antropologia e outra de Antropologia Religiosa, ministradas pela professora Eliana Coelho, graduada e mestra em Sociologia pela UFC.  Quanto à exigência número 5, sobre ciência comparada da religião, temos uma disciplina de Mitologia Comparada, ministrada por Glaudiney Mendonça, professor da UFC, e uma disciplina de História das Religiões ministrada pela professora Juliana Linhares, graduada e mestra em História pela UFC.  Em seguida temos: 7. Estudo de psicologia analítica, começando pelo conhecimento da técnica de diagnóstico das associações, da técnica de interpretação de sonhos e fantasias. Nesse sentido temos 3 disciplinas de fundamentos de Psicologia Analítica, ministradas pelo nosso coordenador, Heráclito Pinheiro (que também leciona as disciplinas de História da Psicologia Analítica e Epistemologia da Psicologia Analítica), que versam sobre os aspectos fundamentais da teoria como: O campo fenomenológico – Consciência – Funções psíquicas – Noções gerais dos tipos psicológicos – Inconsciente pessoal e coletivo – O conceito de arquétipo Teoria dos complexos – Símbolo e autorregulação psíquica – O Processo de Individuação – Unilateralidade e adaptação – A função dos sonhos etc, bem como uma disciplina específica sobre os métodos de interpretação utilizados por Jung. Entre outras disciplinas, temos as disciplinas de Tipos Psicológicos e Psicologia e Religião Ocidental, ministradas pelo professor Fernando Henrique, Psicólogo graduado pela UFC, especialista em Testes Psicológicos, as disciplinas de Sincronicidade e Fundamentos Teóricos da Prática da Psicoterapia, ambas ministradas pelo Professor Ricardo Ribeiro, psicólogo graduado pela UFC, mestre em Psicologia pela USP.

Nosso currículo contempla ainda diversas outras disciplinas como: Psicologia Analítica e Arte, Psicologia e Religião Oriental etc. O intuito do curso é, em termos acadêmicos, fornecer a formação necessária para compreender e utilizar a teoria e os métodos de Jung tendo em mente aquilo que o próprio Jung julgava ser fundamental. Nosso currículo foi elaborado pelo coordenador do curso, Heráclito Pinheiro, que é um reconhecido teórico e epistemólogo, que se dedica a estudar a obra de Jung há quase vinte anos e possui diversos livros publicados sobre a Psicologia Junguiana e Mitologia Comparada. Nosso curso é aprovado pelo MEC, segue todas as exigências necessárias para ser reconhecido como um diploma válido em todo o território nacional, e é expedido pela Faculdade Ratio.


Heráclito Aragão Pinheiro
Graduado em História pela Universidade Federal do Ceará (2006). É mestre em psicologia pela Universidade Federal do Ceará (2009) e Doutorando em Psicologia pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Tem experiência na área de História e Psicologia, com ênfase em História Regional do Brasil e Epistemologia das Psicologias, atuando principalmente nos seguintes temas: teoria e filosofia da história, história das ciências, história das religiões, mitologia comparada, história antiga, epistemologia, Psicanálise freudiana e Psicologia Analítica.
Endereço para acessar currículo lattes: http://lattes.cnpq.br/3719511876084008
Carlos Getúlio de Freitas Maia
Tem experiência na área de Filosofia, com ênfase em Filosofia, atuando principalmente nos seguintes temas: filosofia, pensamento grego, arte, pensamento ocidental e educação.
Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/6564366367725365
Ricardo Nogueira Ribeiro
Possui Mestrado em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo (USP) e Graduação em Psicologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Atualmente é Professor Assistente da Universidade Estadual do Ceará (UECE), Setor Fundamentos Psicológicos da Educação da Faculdade de Educação de Itapipoca (FACEDI). Integrante do INTER PSI - Laboratório de Psicologia Anomalística e Processos Psicossociais, ligado ao Departamento de Psicologia Social e do Trabalho do Instituto de Psicologia da USP. Tem experiência em Psicologia, com ênfase na área clínica, e são de seu interesse os seguintes temas: Psicologia e Religião, Psicologia Analítica e Psicologia do Desenvolvimento
Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/5024448302815086

Eliana Coelho da Silva
Possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Ceará (2010) e mestrado em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (2014). Atualmente é professor substituto da Universidade Estadual Vale do Acaraú. Tem experiência na área de Sociologia, com ênfase em Sociologia da Religião.
Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/1036407053386488
Juliana Magalhães Linhares
Mestre em História Social pela Universidade Federal do Ceará(2011), Licenciada em História pela UFC(2007). Atualmente professora do curso de Pedagogia e História das Faculdades INTA e coordenadora de área do PIBID - História. Atuou no Departamento de História da Universidade Estadual Vale do Acaraú, atuando também na rede privada de ensino superior na Graduação e Pós-Graduação na área de Ciências Humanas e Educação, com experiência em Educação a Distância - EAD.
Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/1341793282507886
Glaudiney Moreira Mendonça Junior
Possui graduação em Ciências da Computação pela Universidade Estadual do Ceará (2002) e mestrado em Ciência da Computação pela Universidade Federal do Ceará (2005). Atualmente é professor da Universidade Federal do Ceará, lotado no Instituto UFC Virtual, e coordenador do curso de Bacharelado em Sistemas e Mídias Digitais. Tem experiência na área de Ciência da Computação, com ênfase em Computação Gráfica, atuando principalmente nos seguintes temas: Realidade Virtual, Interação, Comportamento, Entretenimento e Jogos.
Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/7706674770409286
Fernando Henrique Sales Rodrigues
Tem experiência na área de Psicologia. Maior interesse na área clínica junguiana e fenomenológica, filosofia e bom interesse em Psicologia Cognitiva e Psicologia Social.
Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/4320064898416274
Karine Alves David
Pesquisadora-doutoranda em Estudos da Linguagem na Universidade Federal do Rio Grande do Norte- UFRN. Possui Mestrado em Linguística pela Universidade Federal do Ceará, Especialização em Língua Portuguesa e Graduação em Letras pela Universidade Estadual do Ceará. Ministra em universidades públicas e privadas em cursos de graduação e pós-graduação as disciplinas de Metodologia do Trabalho Científico (Letras, Direito, Administração, Psicologia, Pedagogia) e Projetos. É servidora pública de carreira da Prefeitura Municipal de Fortaleza. Assumiu por quatro anos o cargo, no Governo do Estado do Ceará, de Diretora das Políticas de Livro e de Acervos da Secretaria da Cultura. Consagrou-se em 2010 enquanto Curadora Geral da IX Bienal Internacional do Livro do Ceará, evento de grande porte e projeto prioritário do Governo do Estado do Ceará. Após a Bienal, publicou o primeiro Anuário Literário do Estado do Ceará, enquanto Coordenadora Editorial daquele material. Foi convidada em 2007 pela CAPES para coordenar um curso de Língua Portuguesa no Timor Leste. Foi coordenadora das feiras de livro regionais do Ceará que aconteceram em Sobral e Juazeiro do Norte; coordenou a primeira Feira do Livro de Cabo Verde no Ceará e, também, organizou dez feiras de livro (Feira do Sebo) na Praça do Ferreira, Fortaleza-CE. Fez parte do Conselho Editorial e do Conselho do Mecenato da SECULT-CE e foi membro do Conselho do Programa Alfabetização na Idade Certa (PAIC) implementado pela SEDUC-CE. Foi, durante 2 anos, a representante da SECULT-Ce nos Fóruns Regional e Nacional de Secretários de Cultura, adquirindo bastante conhecimento e experiência nas grandes áreas da Cultural não só regional, como também nacional. Fez parte da elaboração do documento da Constituinte Cultural implementada em 2007 em 179 municípios do Estado do Ceará. De 2008 a 2010 foi membro da Comissão do Programa Mais Cultura do Governo Federal representando o Estado do Ceará. Participou, também, do Conselho de Suporte a Obras de Escritores Cearenses, secretariando o Ministro Ubiratan Aguiar. Desenvolve projetos de grande e médio porte no que concerne às áreas cultural, educacional, social, sustentabilidade e meio ambiente, empreendedorismo e inovação. Atualmente está desenvolvendo pesquisa junto à Universidade de Santa Bárbara - Califórnia sobre a aquisição da escrita no que concerne à argumentação com adolescentes que se encontram em estado de privação de liberdade no Estado do Ceará



quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Núcleo de Estudos von Franz

Iniciamos as atividades do núcleo de estudos Von Franz como um passo inicial e preparatório para, posteriormente, criarmos uma instituição de ensino e pesquisa em Psicologia Junguiana em Fortaleza.

Mesmo tendo começado há pouco tempo, o núcleo Von Franz já vem realizando atividades relevantes, como o grupo de pesquisas sobre o animus (a psicologia feminina), que começou com o estudo dos livros de Barbara Hannah sobre a temática e pretendemos que evolua para o estudo de obras literárias e, por fim, a publicação de uma série de ensaios sobre a temática. 

Também estamos realizando uma série de vídeos sobre temáticas diversas que podem ser acessados pelo youtube, com atenção especial para os fundamentos filosóficos da Psicologia de Jung. Já temos 2 vídeos sobre a temática enfocando Kant e James, dois dos principais filósofos que formam a base epistêmica de Jung. Segue abaixo o link para o canal do núcleo.


Nossos objetivos principais são o de fomentar a pesquisa em Psicologia Junguiana e a formação de pesquisadores e analistas, facilitar o acesso à Psicologia a pessoas interessadas de qualquer outra área,  bem como estabelecer um diálogo com outros campos do saber como a Literatura, Mitologia Comparada, Hermenêutica, História, Cinema e Filosofia. 

Temos muitos planos para o futuro e diversos colaboradores nas mais variadas áreas. Esperamos poder oferecer um espaço para o dialogo que seja não sectário, mas, ao mesmo tempo, pautado pela seriedade e rigor epistêmico. 

Segue abaixo o link para a nossa fanpage no Facebook. Esperamos contar com o seu apoio e entusiasmo, bem como sugestões e críticas.

domingo, 9 de outubro de 2016

William James e sua influência sobre a Psicologia de Jung


Durante o final do século XIX e o início do século XX, William James foi amplamente reconhecido como o principal psicólogo dos Estados Unidos, sua reputação ultrapassava as fronteiras de seu país, sendo considerado, na Europa, como o papa da Psicologia norte americana.
James era filho de uma família irlandesa rica e culta. Ele nasceu em 1842, no Astor House, o hotel mais luxuoso e badalado de Nova York. Já em 1843, fez sua primeira viagem à Europa. Durante sua juventude frequentou escolas nos Estados Unidos, Inglaterra, França e Suíça. James falava francês, alemão e italiano fluentemente e sentia-se muito a vontade em qualquer lugar da Europa.
Ainda jovem, em virtude da posição social e influência de sua família, conheceu grandes nomes do seu tempo como: John Stuart Mill e Lord Tennyson. James tinha três irmãos e uma irmã, Alice. Sua irmã era uma mulher brilhante, com dotes literários, mas que foi pressionada pela família a abdicar de suas ambições e casar. Ela teve uma série de doenças com sintomas neurastêmicos e morreu em 1892 aos 44 anos. Sua morte teve um profundo impacto em James.
James nunca teve uma ideia precisa do que desejava fazer profissionalmente, ele estudou arte, mas apesar de demonstrar grande talento como pintor, abandonou a carreira nas belas artes, provavelmente por seu pai não aprovar essa escolha. Em 1861, James se inscreveu na Lawrence Scientific School, em Harvard. Ele primeiro estudou química, mas odiou o assunto e mudou para o programa geral de história natural onde conheceu Louis Agassiz com quem foi em uma expedição à Amazônia brasileira, mas a viagem foi particularmente difícil para ele devido a complicações de saúde e ao clima debilitante, por isso abandonou a expedição e percebeu que seus interesses eram mais especulativos, e que a vida de coletor sistemático de dados não lhe agradava. Em seu retorno a Harvard resolveu estudar medicina, mas sem nenhum entusiasmo. Em sua opinião havia muita tapeação na medicina e, para além da cirurgia, o médico fazia muito pouca coisa pelos seus pacientes além de tirar dinheiro deles.
Em 1867 e 1868, James interrompeu os estudos de medicina e viajou para a Europa onde visitou os laboratórios de Fechner, Von Helmholtz, Wundt e Du Bois-Raymond. Recebeu o diploma de mestre em 1869 e resolveu jamais praticar a medicina – promessa que manteve pelo resto da vida.
Em 1872, James recebeu a oferta de um cargo como instrutor de fisiologia e anatomia em Harvard, por um salário anual de US$ 600, mas adiou por um ano a decisão de aceitar a oferta e apenas em 1874 ofereceu o primeiro seu primeiro curso em Harvard a respeito da relação entre fisiologia e Psicologia. Em 1882, ele tirou uma licença de Harvad e viajou pela Europa para renovar seus contatos com psicólogos, filósofos e fisiologistas europeus.
Em 1876, aos 34 anos, o seu pai lhe informou que havia encontrado sua futura esposa, Alice Howe Gibbons, professora de uma escola de Boston, e cabia a James cortejá-la. Obedientemente ele o fez e eles se casaram e foram muitos felizes juntos. Alice compartilhava muitos de seus interesses e era incansavelmente dedicada a ele. James, por seu turno, a adorava, uma correspondência de mais de 1400 cartas dele para a esposa foi publicada, testemunhando o afeto que devotava a ela.  Em 1878, James assinou contrato com o editor Henry Holt para escrever um livro de Psicologia. Ele esperava concluir o livro em dois anos, mas levou 12 anos para concluí-lo e tinha a opinião de que livro era excepcionalmente ruim, porém ele estava enganada, era uma obra prima.
Publicado em 1890, os dois volumes do Principles of Psychology, de 1393 páginas, foi um sucesso instantâneo. Escrito de maneira brilhante e fluente, como tudo o que James escreveu, o livro foi lido mesmo por pessoas que não estavam envolvidas com Psicologia em virtude da qualidade de sua prosa, seu estilo elegante e agradável. Em 1892, Henry Holt publicou uma versão resumida do livro de James, Psychology: a brief course, de 478 páginas que também foi um enorme sucesso. Eram os livros padrão utilizados em cursos de Psicologia no mundo inteiro, tendo sido traduzidos até para o russo. Os dois livros eram conhecidos como “James” (Principles) e o “Jimmy” (Brief Course). James nunca se deixou fisgar realmente por nenhuma ciência e possuía interesses ecléticos que incluíam fenômenos paranormais e religiosidade, que ele abordava com um interessante misto de abertura de espírito e agudo senso crítico.
James definiu a Psicologia como “a ciência da vida mental, tanto seus fenômenos como suas condições”. Entre esses fenômenos incluía: sentimentos, desejos, cognições, hábitos, lembranças, raciocínios e decisões. Ele se opunha a abordagem estruturalista de Wundt-Titchener, pois acreditava que ela era desnecessariamente restritiva, estéril e artificial. Sua posição pode ser exemplificada pela afirmação de Henri Poincare “Uma casa é um amontoado de pedras, mas um amontoado de pedras não é uma casa”. James estava mais interessado em descobrir como a mente funciona do que em desvendar a sua estrutura. Para ele a característica mais marcante da Consciência é que ela se adapta, permite que nos adaptemos ao ambiente e possui as seguintes características: 1 – ela é pessoal, 2 – é um fluxo contínuo, está sempre mudando, 3 – ela é seletiva.
James usava uma interessante alegoria para exemplificar a característica seletiva da consciência, pois o mundo é “uma confusão exuberante e barulhenta” na qual “os sons, as visões, os toques, as dores provavelmente formam uma exuberante confusão não analisada”. Se a consciência analisa essa confusão ela torna-se seletiva. Podemos ver uma influência direta na maneira como Jung encara o fenômeno da consciência, para Jung um conteúdo está consciente quando associado ao complexo do eu que, em suas palavras é “altamente compósito e variado”. O eu é o centro do campo da consciência, que é um fenômeno momentâneo de adaptação, se caracteriza por sua intermitência e por outras características como direção, seleção e exclusão, tendendo, pois sempre a unilateralidade. Assim como James, Jung estava interessado na maneira como a consciência funciona e, apoiado igualmente em Kant, afirmava que a “natureza da consciência é um mistério insolúvel”, assim, utilizando o método fenomenológico, poderia ao menos descrever seu funcionamento. Nessa descrição era importante não sobrecarregar a observação com pressupostos teóricos se atendo o mais possível ao fenômeno em questão, entretanto levando em conta que a equação pessoal do pesquisador sempre iria influenciar a sua forma de enxergar.
Outra contribuição de James a Psicologia foi a sua teoria da emoção, que acabou sendo chamada de teoria James-Lange, pois o fisiologista Dinamarquês Carl Lange formulou uma hipótese muito semelhante simultaneamente. James publicou sua hipótese pela primeira vez em um ensaio na revista Mind em 1884. De acordo com sua teoria, o sistema nervoso faz certos ajustes inatos ou reflexos aos estímulos externos e é a percepção dessas mudanças que constitui a emoção. As mudanças fisiológicas são a matéria mental que constitui a emoção. Aqui é possível ver outra espantosa similaridade, resultante da poderosa influência de James sobre o espírito de Jung, basta recordar da noção junguiana de afeto/emoção que possui a característica de produzir enervações somáticas, e a sua distinção de sentimento (Fühlen) como uma das funções racionais ou abstrativas da consciência, sendo, grosso modo, a capacidade de estabelecer uma escala de valores, porém, um sentimento muito forte pode, ao gerar uma enervação somática, transformar-se numa emoção. Apesar de ser notável a influência, nesse aspecto em particular, Jung também foi influenciado pela teoria dos afetos de seu professor e chefe no hospital psiquiátrico Joseph Bleuler.
No Principles, o capítulo mais frequentemente citado é o IV do volume 1, a respeito dos hábitos. Nesse capítulo, James assevera que o sistema nervoso tem a propriedade da plasticidade e pode ser modificado pela experiência. Ele acreditava que os hábitos, ou ao menos a maior parte deles, é formado pela cultura no início da vida e que, até os 30 anos de idade “fixam-se como gesso”. Quando adquirimos novos hábitos chegamos até eles com um estoque de velhos hábitos que podem bloquear ou facilitar os novos. James expressou as consequências políticas e morais de sua teoria da formação dos hábitos em São Francisco em 1910, no aclamado discurso The Moral Equivalent of War. Nessa ocasião ele argumentou que o conhecimento de como se formam os hábitos poderia ser utilizado para construir uma sociedade melhor, livre da guerra, da fome e da indignidade. No Principles, James também considerou como um hábito é retido ou lembrado – o problema da memória. Ele acreditava que os acontecimentos deixam caminhos, rastros entre os centros nervosos do cérebro. Quando esses caminhos são excitados, resulta numa lembrança específica.
Apesar do enorme renome mundial como psicólogo, James nunca se comprometeu com a Psicologia. Em uma carta a seu irmão Henry James (renomado escritor) ele expressou o desejo de ser reconhecido como filósofo e não como psicólogo. Quando em 1901 recebeu em Harvard o título honorífico de Doctor of Laws, James temia que pudessem apresentá-lo como “William James, psicólogo”, e ficou aliviado ao ser apresentado como filósofo.
A filosofia de James é o pragmatismo, e ele foi um dos mais conhecidos e influentes filósofos de sua época, se não o mais famoso e influente. Em uma carta a Flornoy ele definiu sua doutrina como “uma filosofia sem tapeação” o que, de fato, é uma excelente descrição do pragmatismo. Não é ocioso destacar novamente, que a prosa de William James é absolutamente deslumbrante, fluente, elegante, eivada de poderosas metáforas e alegorias, além de anedotas que causam um tremendo impacto no leitor. Seus livros, aulas, discursos e palestras são à base de sua reputação.
Na primeira das conferências publicadas em seu livro Pragmatism, James faz uma afirmação simples, mas de considerável alcance. Ele assevera “A história da Filosofia é, em larga medida, um choque entre diferentes temperamentos humanos” (tradução minha). Para James, o filósofo acredita em seu temperamento e quer um universo que se ajuste a ele, e acredita em qualquer representação do universo que se ajuste ao seu temperamento. Tal filósofo considera homens de temperamento oposto fora de sintonia com o universo, e incompetentes em filosofia, mesmo que eles em muito o superem em habilidade dialética. Isso faz surgir uma certa insinceridade nas discussões filosóficas, pois a mais potente de nossas premissas jamais é mencionada. Os dois temperamentos apontados por James são o racionalista e o empirista. O empirista é um amante de fatos em toda a sua crua variedade, enquanto o racionalista se devota a princípios abstratos e eternos. Na realidade, ninguém pode viver sem os dois, fatos e princípios, trata-se mais de uma diferença de ênfase, mas que mesmo assim gesta antipatia. James também denomina o racionalista de Tender-Minded e o empirista de Tough-Minded (mente tenra e mente dura), com as seguintes características marcantes. Tender-Minded: racionalista (segue princípios), intelectualista, idealista, otimista, religioso, acredita no livre arbítrio, monista, dogmático. Tough-Minded: empirista (segue os fatos), sensualista, materialista, pessimista, irreligioso, fatalista, pluralista, cético.
As duas perspectivas, racionalismo e empirismo, apresentam problemas, pois, ele assevera, o otimismo dos racionalistas soa tão raso quanto o amor por fatos dos empiristas. Na ótica de James, o universo é algo imenso e em aberto, porém o racionalismo constrói sistemas e os sistemas devem ser fechados. A solução para resolver essa disputa entre pontos de vista logicamente irreconciliáveis é a filosofia do pragmatismo, assim, pode-se permanecer religioso como os racionalistas sem perder a rica intimidade com os fatos. Na segunda de suas conferências publicada no Pragmatism, James expõe o método pragmático. Sua “Filosofia sem tapeação” é um método para resolver disputas metafísicas que, de outra maneira, permaneceriam eternamente insolúveis. O pragmatismo não espera nenhum resultado especial, trata-se primeiramente de um método e, em segundo lugar, de uma teoria genética da verdade. O pragmatismo nunca está confortável distante dos fatos, e fala de verdades no plural, sobre sua utilidade, sobre o sucesso com que elas trabalham. O pragmatista se prende a fatos e coisas concretas, observa a verdade e como ela trabalha em casos particulares e generaliza, a verdade se torna uma classe de categorias para valores de trabalho definidos na experiência. Todavia o pragmatismo não é mera empiria nem trabalha influenciado por preconceitos materialistas como os empiristas, não é anti-intelectualista e tampouco faz objeções a formulação de abstrações desde que elas levem a algum lugar. Uma ideia é verdadeira desde que prove seu valor concreto na vida e das suas relações com outras ideias também admitidas como verdade. Nesse sentido, o pragmatismo entende a verdade como algo instrumental, uma ideia verdadeira deve nos ajudar a nos mover em meio ao caos dos fatos, ligando satisfatoriamente os elementos da experiência, simplificando, economizando trabalho, nesse sentido essa ideia será instrumentalmente verdadeira. É digno de nota, que para James, assim como para Jung, as ideias são parte integrante da experiência, não sustentando a ideia de um empirismo puro. Assim, uma Idea é verdadeira desde que nos auxilie a ter uma relação satisfatória com outras partes de nossa experiência. A teoria passa a ser um instrumento e não uma resposta nela mesma.
No capítulo VIII do seu Tipos Psicológicos, Jung trata da concepção tipológica de James. Em sua perspectiva, trata-se de um problema tão antigo quanto à filosofia, mas coube a James esclarecer a existência de tipos e sua influência no âmbito estritamente filosófico, mas nesse ponto de vista, de uma vinculação não histórica, mas de fundo irracional e de raiz psíquica, ele aponta que o tender-minded tem certos traços comuns com o realista e o tough-minded ao nominalista. O realista corresponde ao princípio da introversão e o nominalismo da introversão. A controvérsia histórica sobre os universais faz parte do conflito de temperamentos apontado por James. Ele vai mais fundo do que Abelardo o fez ao tentar sanar o problema dos universais no medievo, pois abarca a oposição dos tipos psicologicamente e tenta uma solução pragmática correspondente, mas Jung considera a saída pragmática apenas uma solução temporária. Além disso, Jung critica a unilateralidade de James ao observar apenas a qualidade do pensamento dos dois tipos, mas também pondera que num tratado filosófico essa atitude é natural e até esperada. Jung considera o ponto de vista pragmático imprescindível, se quisermos fazer justiça aos dois pontos de vista, mas o ponto de vista pragmático pressupõe resignação em demasia e se liga a uma falta de realização criadora, assim, Jung assevera.
A oposição das duas “verdades” exige uma atitude pragmática, se quisermos fazer alguma justiça ao outro ponto de vista. Por mais imprescindível que seja o método pragmático, pressupõe resignação demais e se liga quase inseparavelmente a uma falta de realização criadora. A solução do conflito dos opostos não se dá nem por compromisso lógico-intelectualista, como no conceptualismo, nem pela medição pragmática do valor prático de concepções logicamente inconciliáveis, mas exclusivamente por criação ou ação positiva que assume os opostos como elementos necessários de coordenação, assim como um movimento muscular coordenado implica sempre a inervação dos músculos antagônicos. Portanto, o pragmatismo não pode ser outra coisa do que uma atitude transitória que prepara o caminho do ato criado afastando os preconceitos. (Jung, 2013, p.605).
Aberlado é superado por James assim como este, de acordo com Jung, foi superado por Nietsche em sua resposta ao problema dos opostos. Ainda assim, há uma exigência de uma atitude pragmática para se poder fazer jus as duas possibilidades humanas representadas pela introversão e extroversão. A adoção de uma atitude pragmática, além de livrar o caminho de preconceitos inconvenientes, evita as tapeações que têm se tornado lugar comum no debate Junguiano, desde o mau uso da teoria dos tipos, até o pseudomisticismo bobo que tem sido um grande obstáculo ao debate sério, e, por fim, a profunda incompreensão do método utilizado por Jung. Uma atitude pragmática, se adotada com rigor, nos livra dessas disputas ociosas. James concordava com um decano da faculdade de medicina de Harvard que costumava dizer que se toda a matéria médica, menos o ópio e o éter da maneira coo vem sendo usados, cair no fundo do oceano seria ótimo para a humanidade e péssimo para os peixes. Parafraseando esse decano, se todos esses pseudoproblemas junguianos que eu citei, caíssem no mar, seria ótimo para a humanidade e péssimo para os peixes, que em pouco tempo estariam colorindo mandalas...

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Individuação




https://youtu.be/iY_bGgAz4to

O processo de individuação é uma problemática que surge quase sempre nos estágios finais de um processo analítico. Jung compreende por “analítico” todo processo que se confronta com a existência do inconsciente. Ele utiliza individuação no sentido do processo que gera um individuum psicológico. O processo de individuação só tem sentido diante da hipótese, calcada em observações empíricas especialmente no campo da psiquiatria, de que o inconsciente possui um caráter objetivo e autônomo. Essa autonomia é uma característica geral e normal que se encontra exacerbada no caso patológico, especialmente no campo das psicoses. Em certo sentido, para Jung, o inconsciente pode ser entendido como “realidade in potentia”, onde se podem descobrir qualidades desconhecidas de caráter e possibilidades futuras de desenvolvimento. O inconsciente é como o Janus bifronte, por um lado olha para o passado, por outro antecipa potencialmente o futuro, como Jung assevera em seu Psicologia e Alquimia, todo conteúdo genuinamente anímico é ambivalente. 


https://youtu.be/iY_bGgAz4to

A individuação é o desenvolvimento do indivíduo psicológico como ser distinto da psicologia coletiva, que se caracteriza pela identidade e projeção, é um processo de diferenciação, que tem por meta o desenvolvimento da personalidade individual. Essa meta é completamente diferente do “individualismo”, que não passa de uma “acrobacia da vontade”. O processo de individuação não leva a um isolamento, mas a um relacionamento coletivo mais intenso e abrangente. Paradoxalmente, a individuação pressupõe um mínimo de adaptação à norma coletiva ao mesmo tempo em que está sempre em maior ou menor oposição a ela, pois é uma separação e diferenciação do geral.  É preciso que fique claro que a individuação não vai contra a norma coletiva, mas se constitui em um outro modo, se fosse uma simples oposição seria não um caminho individual, mas uma norma antagônica, e o caminho individual nunca é norma. Para Jung, a individuação nunca é algo simplesmente procurado pelo sujeito, mas já se encontra fundamentada a priori na sua disposição natural.

O inconsciente se manifesta por meio dos sonhos, a “via régia de acesso ao inconsciente”, como Freud o chamou, e se observados por longo período de tempo em grandes séries, é possível perceber uma ampla teia de fatores psicológicos que obedecem a uma determinada configuração ou esquema. Este esquema ou configuração é justamente o que Jung denominou de processo de individuação. Há entre o inconsciente e a consciência uma tendência reguladora que gera um processo de crescimento psíquico, e que pode ser percebida no exame das imagens oníricas. O processo de individuação, que é esse crescimento ou separação da psicologia coletiva e consecução do indivíduo, não pode ser efetuado pela vontade consciente sozinha, mas se trata de um fenômeno involuntário, autônomo, objetivo e natural. Por esse motivo não se trata de individualismo, dos objetivos e planos egoístas da consciência, ao contrário, muitas vezes, no processo de individuação é forçoso abrir mão desses objetivos e planos.  

A individuação é um impulso interior de crescimento ao qual o complexo do eu deve dar ouvidos e prestar grande atenção, e entregar-se a ele sem qualquer outro propósito ou objetivo. Pela observação dos sonhos, ao se perceber essa complicada configuração de imagens psíquicas, percebe-se com clareza uma tendência à ordem e uma orientação finalística, em virtude disso, bem como de certos símbolos específicos de caráter mitológico que aparecem no decorrer do processo, Jung teorizou a existência de um centro regulador do psiquismo que ele chamou de Selbst em alemão. Ele pode ser entendido como um fator de orientação íntima, que por meio dos sonhos provoca um constante desenvolvimento e amadurecimento da personalidade. Até onde vai esse desenvolvimento vai depender do quanto à personalidade consciente vai estar disposta a ouvir as mensagem do Selbst e abrir mão de seus próprios planos e desejos em prol da meta do desenvolvimento da personalidade. O verdadeiro processo de individuação é a harmonização do consciente com o centro interior, o Selbst. Como se pode ver, em geral, o início desse processo causa uma lesão ao eu e isso acarreta sofrimento, pois ele se sente tolhido nas suas vontades e desejos. Nesse sentido, como é sobejamente mostrado nos mitologemas que envolvem jornadas heroicas, a consecução da personalidade é eivada de dores e perigos e nem todos estão à altura da tarefa de tornarem-se quem realmente são.