quinta-feira, 31 de julho de 2014

ELEIÇÕES 2014 NO CEARÁ

A campanha ao governo do Ceará começa morna, isso depois de uma longa indecisão por parte de Cid Gomes quanto ao nome do seu sucessor e semanas de um cenário fluido e camaleônico, mudando ao sabor do vento e frustrando mesmo as mais acuradas tentativas de previsão. A última reviravolta foi o rompimento público de Luizianne Lins com o candidato do PT Camilo Santana, o que, a meu ver, fecha um ciclo de rápidas mudanças de cenário e permite uma tentativa de análise que não nascerá caduca.
Eunício Oliveira possui a vantagem de sair na frente das pesquisas, o que a história nos ensina ser uma vantagem muito relativa. O senador possui um grande recall de sua última campanha, em que, juntamente com Pimentel, bateu pela primeira vez nas urnas Tasso Jereissati. Nessa campanha Lula em pessoa fez um programa com ele, emprestando seu carisma e peso político ao então candidato ao senado. Euníco conta também com a vantagem do dinheiro, sua campanha certamente não padecerá de falta de fundos. Outra vantagem de Eunício reside nas fraquezas de Cid. O atual governador, padrinho político de Camilo, teve uma atuação pífia no combate a seca e na segurança pública, talvez o aspecto mais visível dos problemas graves que assolam nosso estado. Até ontem Cid e Eunício dividiam o mesmo palanque, mas isso não os impedirá de se digladiarem agora como se fossem inimigos de longa data – nem tampouco os impedirá de reatar a velha amizade assim que abaixar a poeira da eleição.
Mas Camilo Santana possui muitos trunfos. O petista conta com a máquina do estado, capitaneada por Cid, com a máquina da prefeitura de Fortaleza, também sob o controle do governador, e, além da capital, Cid possui redutos eleitorais em mais de 50 cidades do interior. Não bastasse tudo isso, Camilo conta com o apoio do governo federal, e Dilma já deu mostras de seu apreço pela família Ferreira Gomes, basta lembrar da campanha de Elmano de Freitas, a presidente sequer gravou um programa para apoiá-lo, seu eloquente silêncio só beneficiou o atual prefeito Roberto Cláudio. Mesmo quando as coisas estavam instáveis, já se dizia que o PT seria o fiel da balança nessa eleição e Cid escolheu um candidato petista. Não sem razão muitos dizem que Camilo é, na verdade, um “cavalo de Tróia” no PT, mas, a bem da verdade, ele já está no partido há 13 anos. Santana possui obstáculos, contra ele pesam o escândalo dos banheiros, sua falta de carisma, e o fato de não ser conhecido na capital. Quando Luizianne deixou clara a sua posição contrária o candidato de Cid perdeu um grande trunfo, pois, goste-se ou não, a “lora” possui um enorme capital político na capital, leia-se votos. Roberto Cláudio, por outro lado, tem feito uma gestão vexatória, tem sido duramente criticado, e é um péssimo cabo eleitoral para Camilo.
Luizianne tem bons motivos para se afastar de Camilo. Ideologicamente o alinhamento do petista a família Ferreira Gomes significa um afastamento do ideário petista, pois, no fundo, eles são neo-liberais, a despeito de viverem das sinecuras do estado, nascidos e criados na escola de Tasso Jereissati. Essa afirmação deve ser vista com certa reserva, pois está cada vez mais difícil diferenciar direita de esquerda. Mas a atual candidata a câmara federal possui outros motivos mais pragmáticos. A eleição de Camilo significa o fim de qualquer pretensão dela ou de Elmano se candidatarem a prefeitura de Fortaleza, ou, ao menos, tornam essa perspectiva muito difícil. Não bastasse isso, caso Eunício seja vitorioso, seu homem de confiança, Catanho, teria uma vaga no senado, pois é suplente de Eunício. Existe, igualmente, uma leitura de que caso Santana seja eleito, isso significaria a derrocada do PT, talvez seja verdade, mas é mais verdade que isso pode significar a derrocada da DS, o grupo de Luizianne.
A despeito disso tudo, se eu tivesse que fazer uma aposta, notem bem, uma aposta, eu diria que Camilo tem maiores chances de se eleger. No que concerne as demais candidaturas, sou simpático à candidatura de Ailton Lopes, seu discurso é mais pé no chão e se distancia do discurso pseudomessiânico de Renato Roseno, além disso, seu objetivo é o de apenas trazer à baila temas mais espinhosos ao debate e fazer um ataque à forma tradicional de se fazer campanha e ao nosso modelo eleitoral. O PSOL não é uma alternativa ao PT, pois eles não jogam pra ganhar. Mesmo assim, já é um enorme avanço que, em um estado tão machista e homofóbico quanto o nosso, um homossexual assumido seja candidato ao governo, isso, por si só, já é digno de nota.
Eliane Novais pode surpreender, em virtude da insatisfação dirigida a Cid e a desconfiança em relação ao argentário Eunício Oliveira, suas chances, porém, são muito pequenas, seria preciso uma reviravolta inaudita para vermos Novais no governo, seu papel é o de fornecer um palanque no Ceará para Eduardo Campos, nada mais.

domingo, 20 de julho de 2014

Dia do Amigo

Hoje é o dia do amigo, devo confessar que não entendo muito da amizado enquanto um sentimento abstrato, e que não tenho dotes poéticos para escrever algo emocionante a respeito, todavia o altíssimo me agraciou com bons amigos, e esse texto é uma justa homenagem a eles. Certa feita, um dos amigos de quem vou falar aqui, me relatou um diálogo com o renomado e saudoso José Alcides Pinto, em que esse lhe dizia que se você precisar de mais do que os dedos de uma mão para contar seus amigos genuínos, provavelmente significa que na verdade não possui nenhum. Como disse antes, tive a ventura de ter bons amigos e em bom número, talvez mais do que os dedos de uma mão, mas vou falar aqui de três, e com isso espero homenagear também os demais.

Começo pelo começo, por um dos meus mais antigos e queridos amigos, Alex Sandro Queiroz, por esse nome, creio que somente a mãe dele vai reconhecê-lo, pois é mais conhecido pela alcunha de Freud. Nos conhecemos na sexta série, o Freud morava muito longe da nossa escola e sempre se atrasava, e num desses dias choveu. Havia uns “combogós” como se diz aqui no ceará, e uma parte da sala ficou bem molhada, atrasado, como de costume, muito alto e desengonçado, ele teve que se dirigir a uma das cadeiras molhadas e passou a diligentemente enxugá-la antes de sentar, atrapalhando a aula da professora de matemática, que era uma chata. A lousa estava cheia de uns problemas de matemática envolvendo colchetes, chaves e parênteses e ela se dirigiu ao “limpador de carteiras” e mandou que os resolvesse. Sem pestanejar, ou protestar, ele caminhou até a lousa e, com um giz na mão colocou a resposta correta em todos, para espanto da professora. Não me recordo ao certo como ficamos amigos, mas o certo é que nos tornamos amigos e passamos boa parte do primeiro e segundo graus juntos. Freud sempre foi um homem de excelentes tiradas e, a despeito de sermos amigos, eu não compartilhava seu amor por números e me ressentia das aulas de matemáticas. Um dia, estávamos caminhando em direção à casa dos meus avós, e eu reclamava da matemática e protestava minha preferência pela física, que me parecia bem mais útil. A resposta que ele me deu foi tão sagaz que se marcou a ferro em meu espírito “a matemática é utilizada para tudo, até para erguer esse muro, nem que seja apenas para contar os tijolos”.

O segundo amigo que desejo homenagear eu conheci mais ou menos na mesma época em que travei amizade com o Freud, e ele também estudava na mesma escola, mas era bem mais novo. Nos conhecemos por meio de amigos comuns, por essa época, diferente do bom moço que ele se tornou, era um conhecido bad boy da nossa escola, com o nada meritório apelido de “Jesuíno Açogueiro”, trata-se de meu dileto amigo Filipe Jesuíno. Já passamos por poucas e boas juntos. Na faculdade ele ainda guardava um pouco do espírito de bad boy que viria a abandonar, como uma enorme intransigência e teimosia que com a maturidade veio a se transformar em invejável firmeza de caráter e numa bússula moral das mais precisas. Desde o começo tínhamos muitos interesses comuns: RPG (que jogamos até hoje), literatura, desenhos japoneses, quadrinhos. Quando ele deixou cair à pele do bad boy da adolescência as pessoas puderam enxergar tal generosidade e largueza de espírito que com facilidade passavam a admirá-lo. Estranhamente, nossas atitudes são das mais opostas, Filipe um sujeito reservado, e eu dos mais expansivos, mas essas diferenças sempre foram fonte de aprendizado mútuo, mesmo que a duras penas. Estou prestes a publicar meu primeiro romance, e Filipe foi o primeiro a lê-lo, não bastasse isso, é o responsável por essa produção finalmente vir a público. Nossa amizade é também uma parceria de estudos, que já rendeu bons frutos e creio que produzirá outros mais, e não tenho receio de afirmar que ninguém incentivou tanto e tão ativamente o meu ofício de escrever quanto este amigo a quem devo tanto.

O terceiro dos amigos que quero homenagear hoje é o mais recente destes, mas parece que nos conhecemos há muito mais tempo. Coincidentemente o conheci no mesmo dia em que conheci a minha esposa. Conversamos um bom tempo e, depois, ela me perguntou de onde eu o conhecia, pois julgou que fôssemos velhos amigos, ao que eu respondi “conheci agora”. Por um bom tempo ela pensou que fosse uma lorota, e que eu conhecia meu bom amigo Rodrigo Passo-Largo desde muito antes daquela noite em que nos encontramos. Foi um encontro fortuito, provavelmente destinado a acontecer. Assim como os dois amigos de quem falei antes, Rodrigo é um sujeito admirável, conheço poucas pessoas com uma fé tão grande em seus sonhos quanto ele. Quis o destino que compartilhássemos do mesmo amor pela obra de Tolkien, digo “o mesmo” como uma lincença poética, pois também não conheço ninguém com maior estima pela obra de Tolkien quanto meu amigo Rodrigo. Esse laço comum nos uniu, e a fé do meu amigo tem sido um farol para mim, que também teimosamente persigo meus sonhos. Associada a essa fé em seu destino há uma disposição para o trabalho, um entusiasmo contagiante, e uma crença naqueles que o cercam que fazem esse sagitariano que vos escreve corar de vergonha, é difícil não ser otimista na presença dele, tudo parece possível e não há obstáculo grande o bastante para fazê-lo esmorecer. Depois do Filipe, ninguém fez mais para me incentivar e ajudar no meu caminho do que ele. Nos conhecemos a pouco tempo, mas já devo ao altíssimo uma enorme gratidão por ter feito nossos caminhos se cruzarem. Rodrigo persegue seus sonhos com um ardor incomum, um entusiasmo impressionante, e uma tenacidade única, e, para minha grande ventura, alguns dos seus sonhos são agora nossos sonhos e logo, logo serão nossas realizações.


Nesse dia do amigo, desejo a todos os meus amigos, de perto e de longe, que possam encontrar sempre e mais a amizade, em todo o seu rico e infinito colorido, pois se há algo que eu sei sobre a amizade é que ela é um tipo de amor e não há nada mais surpreendente e maravilhoso do que o amor. Aos meus amigos que não apareceram nessas linhas mal traçadas, saibam que – mesmo que eu raramente o demonstre – amo, admiro e sinto falta de todos vocês que estão longe. Um bom dia do amigo.

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Ars Longa...



Amanhã, pela segunda vez, inicio uma empreitada de tentar ensinar de uma maneira mais formal algo do que eu aprendi sobre Psicologia Complexa (leia-se Junguiana), dessa vez com o meu dileto amigo e parceiro de estudos Filipe Jesuíno. Estava ansioso pra que o nosso curso começasse logo, não sem certo espanto, percebi que há muitas pessoas interessadas no que temos a dizer, o que me deixa ainda mais ansioso para começar.

Eu acredito que poucos autores foram tão incompreendidos quanto Jung, e julgo que isso preveniu que sua obra tivesse um maior impacto na cultura. Também acredito que, os maiores responsáveis pela mistificação do opus de Jung não sejam seus opositores, mas, lamentavelmente, aqueles que sob o rótulo de “junguianos” praticam quase tudo o que Jung condenava como contrário ao seu método e, principalmente, de escasso uso prático. A Psicologia de Jung é eminentemente prática.

Todavia, creio que apontar esses fatos não basta, na verdade não tem muita serventia, algo que descobri a duras penas. Se há alguma possibilidade de mudar a realidade, isso não se faz apenas com discursos e menos ainda com proselitismo, se faz com trabalho duro. Em certo sentido, essa iniciativa é a nossa resposta à questão de se é possível mudar aquilo que julgamos equivocado nesse universo daqueles que estudam ou pretendem estudar Jung. Meu amigo Filipe já me advertiu algumas vezes para a irrealidade dessa minha expectativa, entretanto, a despeito do meu notável pessimismo no que concerne o laço social que se formou em torno da obra de Jung, não posso deixar de nutrir um certo otimismo.

Mesmo otimista, não me acredito ingênuo, há um longo caminho a ser trilhado e uma quantidade considerável de obstáculos de toda sorte. Além disso, aqueles que interpretam o Jung da maneira como melhor lhe aprazem, continuarão sempre a fazê-lo, e combatê-los é como correr atrás do vento. Estudar uma teoria com rigor não significa fazer uma ortodoxia, ou contrapor o excesso com seu oposto, mas sim agir com a devida circunspecção levando a sério aquilo que Jung nos legou.

No meu otimismo em relação a essa nossa empreitada está à certeza de que daremos o nosso melhor, que temos muito o que compartilhar, que o faremos sem reservas e da melhor maneira que pudermos. Além disso, contribui para o meu otimismo a crença de que em cada uma das pessoas interessadas na teoria de Jung reside à possibilidade de dizer algo de original e que apenas elas podem dizer, e que eu tenho que me esforçar por encontrar isso em mim e, no máximo, estimular isso em outrem, sabendo que nenhum de nós tem uma palavra final, pois esta não existe.

No início dessa empreitada, para não sucumbir à ingenuidade das minhas expectativas, é fundamental ter em mente as palavras de Virgílio “carpent tua poma nepotes”, para não sucumbir à tentação da ortodoxia ou da presunção é crucial recordar o que nos disse Hipócrates “ars longa, vita brevis”.  Espero que mais alguém compartilhe do meu otimismo, e, no futuro, existam muitos frutos a serem colhidos por nossos netos. Eu devo ser grato, pois certamente sou um dos netos que colheu avidamente e ainda colhe os frutos da árvore plantada por Jung. Ninguém pode comer desse fruto sem adquirir junto da nutrição do espírito que ele fornece uma grande dívida, e imensa responsabilidade, a responsabilidade de cuidar da semente que vem com ele e de passá-la adiante. O trabalho de plantar é árduo e requer paciência, mas a memória daqueles que vieram antes de nós deve servir de exemplo, bem como a esperança pelos que virão, mesmo aqueles não conheceremos, deve ser nosso estímulo.

Ὁ βίος βραχύς,                            Vita brevis,
ἡ δὲ τέχνη μακρή,                        ars longa,
ὁ δὲ καιρὸς ὀξύς,                         occasio praeceps,
ἡ δὲ πεῖρα σφαλερή,                    experimentum periculosum,                       
ἡ δὲ κρίσις χαλεπή.                      iudicium difficile.