domingo, 21 de agosto de 2011

Joseph Campbell



Em meus posts, livros, ensaios e artigos, costumo sempre citar as palavras da obra de Joseph Campbell. Como homenagem a esse autor que é uma de minhas mais importantes referências e certamente um dos meus mestres preferidos – mesmo sendo eu um discípulo póstumo – resolvi escrever sobre ele, e não simplesmente citar sua vasta obra ou me apoiar em sua igualmente vasta sabedoria.

Joseph Campbell, ou Joe como os amigos lhe chamavam, foi o maior estudioso de mitologia do século XX, e o criador da mitologia comparada. Ele nasceu na cidade de Nova York no dia 26 de março, em uma família católica de origem irlandesa. Em 1910 seu pai o levou, juntamente com seu irmão mais novo Charlie, para assistir ao “Buffalo Bill's Wild West Show” no Madison Square Garden. Desse dia em diante Campebell nutriria uma paixão e um fascínio inesgotáveis pelos povos americanos nativos. Tamanho era seu deslumbramento pelas histórias e tradições dos povos nativos que, quando sua família se mudou em 1913 para New Rochelle, New York, ele leu toda a coleção de mitologia indígena disponível na seção infantil da biblioteca pública local. Em 1919 um incêndio destruiu sua casa, matando a sua avó e destruindo sua coleção de relíquias e livros indígenas. Em 1921 Joe Campbell a “Dartmouth College” para estudar biologia e matemática, todavia após a leitura de “Merejkowski's The Romance of Leonardo da Vinci” ele descobre as humanidades e se transfere para a “Columbia University” e entra para o departamento de inglês.

Durante os anos de 1924 a 1926 ele se engaja em inúmeras atividades na universidade: atletismo, toca saxofone, em uma viagem de navio a Europa ele conhece e se torna amigo de Jiddu Krishnamurti, que o apresenta a filosofia oriental. Em 1925 recebe o diploma de bacharel em Artes, no mesmo ano participa de competições de atletismo em São Francisco, visita o Havaí e comparece a um rodeio indígena em Yakima, Washington. No ano de 1926 ele retorna a Columbia, onde consegue seu diploma de mestrado, com a dissertação “The Dolorous Stroke” sobre a lenda do Graal.

Durante os anos de 1927 a 1928 Campbell ganha uma bolsa de estudos e viaja a França para estudar com Joseph Bedier, o tradutor de Tristão e Isolda. Seu programa de estudos incluía filologia do romance, francês antigo e provençal. Na efervescente Paris do começo dos anos vinte ele conhece a arte moderna (Picasso, Brancusi, e Braque) e a literatura moderna (Yeats, Eliot e principalmente Joyce). Ainda na França ele faz amizade com a artista Angela Gregory, que esculpe um retrato de Joe Campbell e o apresenta a seu mestre, o escultor Antoine Bourdelle, que o ensina sobre estética. Depois Campbell se transfere para a universidade de Munique com o intuito de estudar literatura em Sanskrito e filologia Indo-européia. Na Alemanha, ele descobre as obras de Freud, Jung Thomas Mann, e Goethe.

Campbell retornou aos Estados Unidos em 1929, apenas duas semanas antes do “crack” da bolsa de Nova York. Tendo desistido do seu doutorado, ele aluga uma cabana em Woodstock (por vinte dólares ao ano) e continua perseguindo seus estudos iniciados na Europa, lendo intensivamente. De 1931 a 1932 ele viajou de carro (um Ford T), parando em San Jose, Califórnia para se encontrar com sua velha amiga Adelle Davis, ela o apresentou ao casal John and Carol Steinbeck, John tornou-se escritor, e, em um de seus livros, há uma festa que foi celebrada em homenagem a Joe. Nessa época ele descobriu a obra do historiador Spengler, e também conheceu o biólogo Ed Ricketts (o único que  tinha um emprego nessa época).

Em 1933, após enviar seu currículo para 83 escolas, ele é aceito na “Canterbury prep school” onde ensina francês, alemão, história e continua estudando Spengler, Mann, Jung, Joyce. Ao final desse mesmo ano, ele se demite e retorna a Woodstock para ler e escrever (compreendo bem essa decisão). Em 1934 Campbell é convidado para lecionar na recém fundada “Sarah Lawrence College”. Ele narra essa passagem de sua vida em alguns de seus escritos e palestras, estava prestes a recusar ser professor novamente, quando olhou ao seu redor e se viu em meio a um monte de belas jovens e pensou que não seria nada mal ficar trabalhando ali. Ele permaneceu no departamento de literatura por 38 anos.  Em 1938 Joe se casa com sua ex aluna Jean Erdman, que fazia parte da companhia de dança de Martha Graham.


Em 1941, Joe conheceu o grande orientalista, que também era amigo pessoal de Jung, Heinrich Zimmer, que o recomendou a Paul e Mary Mellon, os fundadores da “Bollingen Series” (ambos foram pacientes de Jung), e o recomendou para produzir o primeiro volume da série de livros intitulado: “the Commentary to Where the Two Came to Their Father: A Navaho War Ceremonial”, escrito por Jeff King e com pinturas de Maud Oakes.


Após a morte de Zimmer, Campbell trabalhou para editar alguns de seus livros inacabados e, em 1944, finalmente publica seu primeiro livro: A Skeleton Key to Finnegans Wake, escrito em conjunto com Henry Morton Robinson. A história desse livro é no mínimo divertida. Quando o Wake de Joyce foi lançado na América ninguém o entendeu, isto é, segundo Campbell, apenas ele e mais um punhado de Irlandeses malucos conseguiu entender. Pouco depois, Thornton Niven Wilder começou a fazer enorme sucesso com sua peça intitulada: he Skin of Our Teeth, supostamente baseada em lendas e folklore americano, não passava, todavia, de um plágio descarado do Wake. Quando Campbell tentou vender seu livro, nenhum editor quis publicá-lo. Quando ele reparou no que Thornton Niven Wilder estava fazendo, sem dar nenhum crédito a Joyce, eles publicaram uma matéria no jornal desmascarando o autor da peça. Wilder simplesmente mandou as pessoas lerem o livro e compararem os dois. Campbell passou a considerá-lo um canalha ainda maior, pois o Wake é um livro que, há época, era tido quase como ininteligível. Campbell e Henry Morton escreveram e publicaram uma série de artigos de jornal comparando os dois textos frase a frase, mostrando até mesmo algumas cópias descaradas. Com a enorme atenção que receberam da mídia, conseguiram publicar o livro, até hoje tido como uma obra seminal sobre o mais complexo e maravilhoso romance do século XX (e que figura orgulhosamente em uma de minhas estantes). O Wake de Joyce tem grande importância para a obra de Campbell, sua noção de monomito surgiu a partir da leitura da obra-prima de Joyce.

Sua consagração veio com sua obra-prima: The Hero with a Thousand Faces, publicado em 1949, pela Bollingen Series. Esse livro, que inspirou George Lucas a escrever os roteiros de StarWars, foi inúmeras vezes rejeitado por editores, um deles chegou a perguntar a Campbell “quem vai ler isso?”.  Muito mais poderia ser contado, Joe Campbell morreu em 30 de Outubro de 1987 (eu já tinha 9 anos e já lia desde os 4, mas infelizmente só conheci a obra de Campbell por volta de 2001) no ano seguinte, a Sarah Lawrence College estabeleceu a cátedra de Mitologia Comparada.

Meu interesse por mitologia surgiu aos nove anos com a leitura da obra de Monteiro Lobato (aos nove já lera toda ela), mas foi apenas com Campbell que essa paixão floresceu, o primeiro livro que li de Joe Campbell foi o primeiro volume de seu “The Masks of God”. Estava repousando após uma pequena cirurgia e acabara de entrar para a faculdade de História após abandonar outro curso de graduação, o livro me fora emprestado por meu dileto amigo Filipe Jesuíno, doravante não parei mais de ler e reler seus livros, principalmente por que, alguns meses depois, o mesmo amigo me emprestou “O Homem e Seus Símbolos”, bom, até hoje leio e estudo esses autores, mas indubitavelmente, Campbell é o mais prazeroso de se ler e certamente o mais divertido, e cada página de seus livros esconde uma sabedoria profunda e singela que até hoje me encanta e surpreende.


Segue uma lista dos livros de Campbell:



A Skeleton Key to Finnegans Wake. With Henry Morton Robinson. New York: Harcourt Brace & Company, 1944. Last edition published in 1983 by Harcourt Brace Jovanovich. Currently out of print.

The Hero With a Thousand Faces (Bollingen Series XVII). New York: Pantheon, 1949. Second edition, Princeton: Princeton University Press, 1968. Commemorative edition, Princeton University Press, 2004.

The Masks of God (4 volumes). New York: The Viking Press, 1959-1968. Volume 1: Primitive Mythology (1959). Volume 2: Oriental Mythology (1962). Volume 3: Occidental Mythology (1964). Volume 4: Creative Mythology (1968).

Flight of the Wild Gander: Explorations in the Mythological Dimension. New York: Viking Press, 1969.

Myths to Live By. New York: Viking Press, 1972.

The Mythic Image (Bollingen C). Princeton, NJ: Princeton University Press, 1974.

Tarot Revelations. With Richard Roberts. San Francisco: Alchemy Books, 1979, 1982.

Historical Atlas of World Mythology (2 volumes, 5 parts), 1983-1989. Two volumes of a projected four volume series were completed by Campbell before his death. Volume 1: The Way of the Animal Powers. New York: Alfred van der Marck Editions, 1983 (first edition). Also: New York: Harper & Row, 1989. Part 1, Mythologies of the Primitive Hunters and Gatherers. Part 2, Mythologies of the Great Hunt. Volume 2: The Way of the Seeded Earth. New York: Harper & Row, 1988. Part 1, The Sacrifice. Part 2, Mythologies of the Primitive Planters: The Northern Americas. Part 3, Mythologies of the Primitive Planters: The Middle and Southern Americas.

The Inner Reaches of Outer Space: Metaphor As Myth and As Religion. New York, NY: Alfred van der Mark Editions, 1986.
Transformations of Myth through Time. New York: HarperCollins, 1990.

Mythic Worlds, Modern Words: On the Art of James Joyce. Ed. Edmund L. Epstein. New York: HarperCollins, 1993. Second ed., Novato, Calif.: New World Library, 2004
Baksheesh and Brahman: Indian Journal 1954 - 1955. eds. Robin & Stephen Larsen and Antony Van Couvering. NY: HarperCollins, 1995. Second ed., Novato, Calif.: New World Library, 2002.
The Mythic Dimension: Selected Essays 1959 - 1987. Ed. Antony Van Couvering. HarperSanFrancisco, 1997.

Thou Art That : Transforming Religious Metaphor. Campbell, Joseph, and Eugene C. Kennedy. Novato, Calif.: New World Library, 2001.


Sake & Satori: Asian Journals, Japan. ed. David Kudler. Novato, Calif.: New World Library, 2002.

Myths of Light: Eastern Metaphors of the Eternal. ed. David Kudler. Novato, Calif.: New World Library, 2003.

Nenhum comentário:

Postar um comentário