Escrevo
hoje, logo depois da divulgação da notícia de que os delatores da lava-jato
implicaram Aécio Neves, não para apontar o dedo aos seus eleitores e
apoiadores, nem mesmo para “celebrar” esse acontecimento, mas para ponderar
suas consequências e pensar um pouco a nossa sociedade em meio a tudo isso,
especialmente o papel desempenhado pela nossa mídia.
Nossa
imprensa vive, hodiernamente, de “denuncismo” e de “declaracionismo”, ou seja,
não é preciso investigar, não se necessita de fontes ou de comprovações, não,
tudo o que se necessita é de alguém disposto a “colocar a boca no trombone”. Me
recordo do Roberto Jeferson, que sem evidência alguma, a não ser, como o
afirmaram seus colegas tribunos “a rainha das provas” a confissão, tentou
incendiar a república para tirar daí suposto proveito próprio. Nossa imprensa destrói
reputações, atua de maneira caluniosa, parcial e respaldada na denúncia de
ocasião, ou naquela que irá render os dividendos políticos que lhe interesse no
momento. Por esse motivo a delação de Aécio não me empolga, vivemos numa
democracia... E a mídia nos ensinou que o “onus
probandi” pelo visto cabe não a quem
acusa, mas a quem se defende. A mídia nos ensinou que não devemos mais presumir
inocência, mas culpa. Mas eu sou lento, aprendo devagar, aparentemente, e ainda
acredito que o senador tem o direito constitucional a ampla e irrestrita defesa
e que é inocente até prova em contrário. Infelizmente, para a maioria da nossa
população, a pedagogia da mídia foi mais eficiente, e talvez ele já seja
julgado de antemão, talvez.
Digo
talvez, pois a pedagogia orquestrada por essa nossa mídia que adora o teatro
das denúncias e delações, também procurou ensinar as pessoas a identificar a
corrupção com um único grupo: o PT. Aprendemos na TV que só um partido é
corrupto, e mais, que ele inventou a corrupção que antes não existia, e, mesmo
que existisse, ele a elevou a níveis “nunca antes vistos na história desse país”.
Assim como as denúncias e delações não precisam de respaldo qualquer, essa
narrativa que criminaliza apenas um partido, não precisa de evidência, basta o
combustível de nossos preconceitos afetivos e quimeras.
Somos
uma nação em que aceitamos passivamente chacinas e mais chacinas em bairros
pobres, aceitamos presídios que fariam um inquisidor medieval ter calafrios e
pesadelos, aceitamos candidamente uma polícia militar incompetente e assassina,
aceitamos, e até clamamos, por desrespeitos flagrantes aos direitos humanos. Hoje
não temos mais vergonha de sermos racistas, homofóbicos e machistas, é tudo
culpa do PT mesmo. Sendo tudo culpa do PT, eu não preciso mais ter culpa de
nada, tudo me é permitido, todo o mal me foi alienado, está em outrem, logo
tudo o que parte de mim é bom, mesmo que seja misoginia, xenofobia, preconceito
e intolerância, pois eu estou do lado do bem. Assim seguimos impedindo essa
revolução comunista que nunca chega, seguimos dando uma propina ao guarda, ou
furando a fila, ou sonegando impostos e sonhando com os tempos maravilhosos da
ditadura.
Quanto
ao senador tucano Aécio Neves, bom, isso cria uma fratura significativa nessa
narrativa que coloca toda a culpa em um único bode expiatório, mas ainda
podemos voltar ao velho expediente de criminalizar a política como um todo, ou
simplesmente jogar a coisa pra baixo do tapete. Logo, logo essa lava-jato sai
das manchetes, vamos esperar os petistas fazerem outra coisa de errado e aí
voltamos a atacar com todas as manchetes possíveis e imagináveis. Enquanto isso
a nossa república segue cada vez mais fragilizada, nossa sociedade segue cada vez
mais intolerante, e o abismo segue ficando cada vez mais próximo.