Ontem
durante o último dia de SANA-fest, na sala temática da Toca-Ce, tivemos um bate
papo com autores de fantasia de Fortaleza e, em determinado momento, Rodrigo
Passo-Largo, que conduzia animadamente nossa conversa pediu que fizéssemos perguntas
uns aos outros e a escritora Kamile Girão (muito fofa como sempre), me
perguntou “Por que o Japão?”. Creio que a pergunta é muito pertinente, por
isso, vou tentar respondê-la novamente por escrito.
Eu
já publiquei 3 livros, dois deles possuem temática oriental. Meu primeiro livro
Naruto e a Mitologia Oriental, um estudo de mitologia comparada tendo por base
o manga/anime Naruto, explorando, principalmente, os aspectos das mitologias
japonesa e chinesa na referida obra. E a pergunta da Kamy se refere ao meu
romance de Dark Fantasy OBAKEMONO que utiliza personagens da mitologia e
folclore japonês e, algumas criaturas, histórias e deuses da Índia e da China. A
tal ponto a influência é poderosa, que o título do livro é uma palavra em
japonês obakemono (化け物)
significa – numa tradução livre – monstro.
Apesar
de eu acreditar firmemente que o meu livro não é uma extensão de mim, ou um
simples reflexo da minha personalidade, eu não tenho outra opção para responder
a esse questionamento a não ser fazendo referência a minha biografia. Minha mãe
era – e é até hoje – fã de Bruce Lee, e, assim que eu me coloquei sobre duas
pernas, me incentivou a praticar artes marciais. Comecei com judô aos 6 anos de
idade, eu era uma criança miúda e muito magra, minha faixa azul dava voltas e
mais voltas na minha cintura. Anos depois, já crescido, eu achei essa mesma
faixa e ela sequer dava a volta na minha cintura, mesmo eu sendo um sujeito
esbelto. Pelos próximos 3 anos eu treinaria judô regularmente e, depois, aos
nove e até os 16, mais ou menos, passei a treinar Karatê. As duas artes marcais
japonesas tiveram um peso imenso na formação do meu caráter, me dando um
poderoso senso de disciplina, estoicismo e autocontrole.
Mais
ou menos por volta de 1996, ou 97, comecei a treinar Kung Fu Shaolin do Norte
(minha grande paixão) e, alguns anos antes, comecei a ler tudo o que me caía nas
mãos sobre budismo e taoismo. Um belo dia, mais ou menos por essa época, eu vi
uma reportagem no jornal com uma foto enorme de um monge zen a caráter que
falava de uma sanga de budismo Soto zen em Fortaleza. O monge Zen era Flávio
Bombonato, discípulo direto de Tokuda, e que viria a se tornar também um bom
amigo e meu professor de Shiatsu e medicina chinesa. Eu passava dos livros
sobre budismo para a prática, justamente com a mais prática de todas as escolas
Mahayana. Mais ou menos por volta do ano de 2000 eu comecei a estudar japonês
no Curso de línguas na UECE (hoje um dos melhores do nordeste) ao mesmo tempo
em que iniciava meu curso de graduação em história e, um pouco antes do grande
boom dos quadrinhos e desenhos animados japoneses.
Um
dos nossos professores, o lendário sensei Hendrik, hoje residindo no Japão, possuía
além de uma enorme e imorredoura paixão pela língua japonesa, uma imenso
fascínio pelo ninjutsu. Depois de sua primeira viagem ao Japão para estudar,
por volta de 2003, eu acho, ele retornou tendo treinado com o Shinhan Nakadai,
da Bujinkan, e formamos um grupo de treinos de ninjusu – muito brutal e muito
divertido – e depois fizemos contato com o shidoshi Miguel Greg – um artista
marcial incrível e um sujeito muito bacana – que passou a nos orientar. Hendrik
depois de se mudar definitivamente para o Japão deixou de lado a Bujinkan em
virtude da impossibilidade da escola de comprovar historicamente qualquer
ligação com o ninjutsu histórico e passou a se dedicar ao Iajutsu da escola Shinkage
ryu.
Foi
desse caldo que mistura artes marciais, língua japonesa e budismo, que surgiram
os romances que escrevi, OBAKEMONO é o primeiro a ser publicado. A pergunta da
Kamile, todavia, me parece permanecer sem resposta, ou, ao menos, sem uma
resposta objetiva. Creio que talvez uma resposta possível seja a de que foram
essas imagens, da rica, colorida e exuberante mitologia asiática, que a minha
alma elegeu para representar a si mesma por meio da fantasia. Eu também venho
estudando filosofia e mitologia grega desde moleque, creio que desde os nove
anos, mas, ainda assim esses elementos só aparecem de maneira indireta na minha
obra. No fundo, eu creio que uma resposta definitiva para essa questão é um
mistério, e, talvez, decifrar o mistério da minha alma, que se expressa por
meio daquilo que escrevo, seja algo demasiado para esse curto texto ou, quem
sabe, para essa minha curta vida...
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